Conheço a minha face mais detestável – a que adia e suprime prazeres, por ser incapaz de se mexer para sair do lugar onde, em certos dias, uma certa melancolia funciona como as ruas de Cesário Verde, ao anoitecer…
“Nas ruas, ao anoitecer
Há tal sonoridade, há tal melancolia
Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer”.
Em dias desses amargo os sentidos mesmo que à minha volta apareçam algumas solicitações, algumas sugestões, as suficientes para poder deixar o cais e abrir as velas em direcção a objectivos concretos, com rumos certos.
Porém, há dias em que “todos os lugares são os mesmos lugares, todas as terras são a mesma terra”, diz Álvaro de Campos e com ele eu digo que há dias em que “escrevo palavras e palavras e palavras, a dizer que não tenho nada que dizer; palavras a teimar em dizer isso (…) (estando) a verdade toda, e a vida toda fora delas e de mim”. (ele dizia “versos” e eu digo “palavras”).
Nestes dias a poesia parece ajudar. Deve ser por isso que pego nos livros e os folheio. Ou dirijo o olho fotógrafo para pormenores, em busca de tudo o que me preencha este “desejo absurdo de sofrer”, embora quisesse encontrar tudo “alegremente exacto”...
"Ah, todo o cais é uma saudade de pedra”, diz ainda Álvaro de Campos; e diz também, alinhando os versos:
“Quando olho para mim não me percebo.
Tenho tanto a mania de sentir
Que me extravio às vezes ao sair
Das próprias sensações que não recebo.”
Nestes dias de enfado há uma inércia negra que chega a ser violenta de tanta passividade e de tanta espera.
Tudo, e em tudo, um grande
paradoxo!
Folha seca e abandonada às primeiras brisas do Outono.
2 comments:
Quisera quimera de pontes quebradas de tédio...
Com Mário Sá Carneiro ou Pessoa, agitamos sp qqr coisa.
bj
Quisera quimera de pontes quebradas de tédio...
Com Mário Sá Carneiro ou Pessoa, agitamos sp qqr coisa.
bj
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