“Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os Homens! Morder como quem beija
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino se Aquém e de Além Dor!
É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!”
…
Se eu fosse ela...
Disseram que eu acendo as fogueiras dentro de mim própria com as palavras que invento. Que coabito comigo e tenho tudo dentro de mim, como se fosse hermafrodita. E que me impus amarras que ninguém quebra.
Disseram também que eu faço temer com o poder das minhas palavras, que pode ser o poder dos olhos, se não as digo.
Disseram muitas coisas, tantas quantas cada um quer dizer se me intercepta a meio caminho, entre mim e o que não contenho.
Também disseram que sou mitificadora. Pouco importa.
Há qualquer coisa de autofágico em pessoas assim, talvez loucura ou qualquer coisa situada a meio caminho entre mim e o que não sei dizer à vida, dizendo-o em palavras que apenas vão de mim para o meu amor pelo próprio amor.
“Altiva e couraçada de desdém,
Vivo sozinha em meu castelo: a Dor
Passa por ele a luz de todo o amor…
E nunca em meu castelo entrou alguém”.
(Castelã da Tristeza)
Uma sensibilidade assim vem da loucura ou conduz a ela, não sei ainda qual é o sentido do processo. Mitificação do amor; amor querendo sentir-se sabendo da sua impossibilidade porque está gelada a capacidade de entrega; gelada ou arrefecida pelo medo. Ou pela vontade de mitificar uma coisa que, se for concreta, perde a essência.
Uma sensibilidade que gera a vontade de ver amor em tudo, de sentir amor por tudo, sem nada ser capaz de sentir.
É talvez essa a razão feroz da procura (ou a razão da feroz procura).
Haverá qualquer coisa no mundo que quebre o gelo?
Talvez o braseiro das fogueiras, por isso as incendeio deixando que elas consumam o que me pertence e que ninguém pode tirar de mim porque ninguém soube ainda quebrar as amarras.
Talvez o sofrimento do próprio processo criativo, o voar lento e brando das aves de asas longas, em vez do voar picado da gaivota.
Talvez a procura do prazer pelo prazer, engano dos que pensam que me entrego, engano dos próprios homens a quem amei, porque o que amei neles não foram eles mas o amor que queria ter sentido. Tudo dentro de mim.
Talvez a vingança de qualquer coisa obscura que passa pelo domínio do outro. O prazer do domínio. O desafio de ocupar o lugar cimeiro destronando o outro com o fluir das palavras-frases, olhos abertos ao lugar das confissões e do despir fácil, fragilizando quem quer que esteja para além de mim, sem sequer lhe ver o rosto. Ou inventando estátuas em chamas à força de lhes sentir o gelo, recusando o calor dos olhos próximos.
Quem inventa consegue ser o começo e o fim das coisas, chegando a confundir-se a si próprio com a imaginação criadora.
Amar o amor é uma cruxificação.
“ Gosto da Noite imensa, triste, preta,
Como esta estranha e doida borboleta
Que eu sinto sempre a voltejar em mim!”
(A minha tragédia)
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5 months ago
1 comment:
Foi encontrado o primeiro vencedor! :)
bj
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