1894: A 8 de Dezembro, nasce Florbela Espanca em Vila Viçosa.
1915: Casa com Alberto Moutinho.
1919: Entra na Faculdade de Direito, em Lisboa.
1919: Primeira obra, Livro de Mágoas.
1923: Publica o Livro de Soror Saudade.
1927: A 6 de Junho, morre Apeles, irmão da escritora, causando-lhe desgosto profundo.
1930: Florbela morre, em Matosinhos.
1931: Edição póstuma de Charneca em Flor, Reliquiae e Juvenilia e ainda das colectâneas de contos Dominó Negro e Máscara do Destino. São reeditados os dois primeiros livros.
Florbela conheceu três mães: a sua própria, Antónia Lobo, “rapariga exposta”, Mariana Toscano, a mulher legítima de João Maria Espanca, que não lhe deu filhos e por isso adoptou os ilegítimos (Florbela e Apeles) e depois Henriqueta de Almeida, segunda mulher de seu pai.
Poderá ver-se nesta insuficiência da imagem materna a origem da sua permanente evasão da realidade. E também da passividade com que desempenha a sua função de esposa, em casamentos tempestuosos: Alberto Moutinho, António Guimarães e Mário Lage terão convivido com uma mulher que mitificou o amor, não achando, nunca, satisfação nele, coabitando até à morte com a sua tragédia narcísica.
Exprimiu assim o carácter sublime do amor feminino:
“Gosto de ti apaixonadamente,
De ti que és a vitória, a salvação,
De ti que me trouxeste pela mão
Até ao brilho desta chama quente.”
E exprimiu também assim, paradoxalmente, como só a alma feminina sabe fazer, a ânsia de amar da procura sem retorno:
“Mesmo a um velho eu perguntei: _ Velhinho,
Viste o amor acaso em teu caminho?
E o velho estremeceu… olhou… e riu
E eu paro a murmurar: “Ninguém o viu!”
Doente desde muito cedo, Florbela poderá ter nascido de uma mãe sifilítica, sendo essa uma possível razão para os seus males pulmonares ou para um temperamento neurótico que se traduzia em tremores, angústias, analgia, excesso de sensibilidade, a irritabildade e insatisfação. Impulsos exigentes são-lhe também apontados, quase caprichos de menina a quem o pai faz as vontades, chamando a si a urgência do amor em explosões de alma intranquila.
Conhecemos-lhe uma rede de desejos em delírio discordante, quase uma permanente tragédia narcísica, que a leva a chorar as dores de si para si porque acende fogueiras com palavras inventadas, porque é umbral da sua própria dor, consumindo-se a si própria. Tem tudo dentro de si – hermafrodita, como lhe chamou José Régio – da sensualidade à catalização, da animosidade perante o eu até ao instintivo processo criativo. Ela cumpre a paixão do poeta, a de sentir a sua dor, ou melhor, as suas dores, a escrita e a referencial.
“A minha Dor é um convento ideal
Cheio de claustros, sombras, arcarias,
Aonde a pedra em convulsões sombrias
Tem linhas dum requinte escultural.”
Nas terras alentejanas, outrora dominadas por uma elite intelectual e guerreira de origem celta, terá permanecido uma certa concepção da influência feminina dentro dessas estruturas jurídicas, sendo que o casamento não tinha um carácter sagrado. Terá Florbela sido herdeira, como avança Agustina Bessa-Luís, do conceito celta de divindade feminina que depois as sociedades romano-cristãs condenaram? O que é facto é que a poetiza não foi escrava do homem nem dos contratos de casamento; nela houve sempre a exibição explícita de uma sexualidade que assumiu um lugar de símbolo ou de mito, mais do que de objectivo. Emoção exaltada é a expressão das suas cartas para Apeles, de conteúdo intenso, na linha da intensidade com que usa as palavras nos seus sonetos, quer sejam de natureza exaltada, quer funesta, uns e outros desencontrados da felicidade.
O seu ideal era de completa fusão de dois amores, de duas almas, de dois corpos:
“Tudo o que é vida e vibra eternamente
É tu seres meu, Amor, e eu ser tua”
Mas o desengano nunca tarda:
“Procurei o amor que me mentiu.
Pedi à Vida mais do que ela dava;
Eterna sonhadora edificava
Meu castelo de luz que me caiu!
Que terá acontecido quando a 7 de Dezembro de 1930,ocorreu a tragédia final? Uma neurótica que ingere uma dose suplementar de comprimidos ou uma mulher doente que os toma para se livrar da dor física e de todas as outras, bem piores, por certo. Ou não o soubéssemos nós, mulheres, que passamos a vida a discursar sobre a solidão, cumprindo sempre a paixão do poeta, que é a eterna paixão da dor.
“Ser poeta é ser mais alto, é ser maior Do que os homens! Morder como quem beija! É ser mendigo e dar como quem seja Rei do Reino de Aquém e Alem Dor!”
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