Monday, February 20, 2006

A Comemoração (2)

(continuação)
As garrafas de champagne que cuidadosamente refrescara para dar prazer a quem consigo quis ser solidário, amigo, companheiro, continuavam no seu lugar, transpirando gotas que iam deixando na mesa um laguinho. Seria melhor voltar a colocá-las no frigorífico? O tempo estava a passar e ninguém chegava. Mais um jeito na decoração. Tudo devia estar perfeito.
Que recordação boa a do cansaço do dia anterior. Preparava, havia uma semana, todos os detalhes e com as compras arrumadas no carrinho do supermercado, na véspera, ainda olhara de soslaio a menina da caixa, quando lhe perguntou se eram mesmo doze garrafas, respondendo-lhe, com o tom de voz mais afirmativo que usava nessas circunstâncias, “são mesmo doze, minha senhora”. Ainda ia sair-lhe um “porquê?” irónico, mas essa contenção, sinal da sua mudança, valeu-lhe uma melodia vitoriosa, no regresso a casa. Sim, que ela cantava, quando as coisitas complicadas do dia-a-dia a descontrolavam. Anteriormente devorava cigarros, misturados com exacerbações verbais ou escritas no espaço virtual, para quem a quisesse ler. Agora estava curada dessas impetuosidades e por isso precisava de comemorar. Estava deveras cansada, precisava de uma bebida. Desde as oito da manhã envolvida na tarefa deliciosa de decorar a sala, balões e fitas, na mesa a toalha de linho mais bonita e sobre ela as travessas com as iguarias que acompanhariam a bebida, muita bebida que a festa queria-se animada! Andava numa verdadeira roda-viva. Sozinha, claro! Ajudas para quê, quando todos chegassem iriam dar-se conta de ter entrado num mundo perfeito e elogiar a sua capacidade organizativa.
Fez questão de acabar tudo antes da hora para ter tempo de se sentar a apreciar a sua obra, antecipando o prazer da companhia, das vozes, do fumo do tabaco e do tinir dos cristais, entre as gargalhadas. Mas agora reparava que o tempo continuava a passar sobre a hora marcada.
Estão para chegar amigos sérios – pensava – que não esboçam um gesto de traição nem sequer de censura; que tão bem compreendem outro e não questionam, não troçam, não conspiram. Cada um no seu espaço, cada um no seu teclado, cada um na sua casa. Cada um cumprindo um tema de conversa, sem equívocos.

(continua)




5 comments:

Maria do Rosário Sousa Fardilha said...

tanta antecipação! isto vai acabar mal! ;)

Mónica said...

os famosos jantares da sophia: ou era da mónica?!
;-)
e os riscos no chão?
não faças sofrer conta!

mfc said...

Hummm... não sei se estou a ver bem!!Mas acho que sim...cada um no seu lugar!

ivamarle said...

continua por favor, antes que eu morra de sede...

SoNosCredita said...

"Agora estava curada dessas impetuosidades e por isso precisava de comemorar."

vantagens que só vêm com o tempo!
:)