Tuesday, January 31, 2006

O prazer dos textos

Em lugar de destaque a simbologia.
Por dentro os relatos, os registos de eventos e de procedimentos.
Em narrações históricas onde se conciliavam o registo individual e o colectivo – as crónicas – fazia-se passar o natural carácter didáctico de eventos heróicos, deixando-se testemunhos escritos para outros tempos. Eram essas narrações redigidas segundo uma ordem cronológica e visando já a divulgação própria de quem não queria que os factos caíssem no esquecimento – fazia-se a História.
Efectivamente, neste período os cronistas afirmam a grande importância do registo do que viram ou ouviram, sendo este um dos vectores das narrativas produzidas.
Importante é a procura de um tipo de discurso histórico de um exacto momento – aquele presente – bem como a verificação de uma eventual transmutação das imagens construídas, noutros tempos – os presentes vindouros.
É, pois, uma tarefa deslumbrante, desvendar o discurso historiográfico de um tempo procurando desmontar a construção feita nesse presente. Tudo feito noutro presente.
O difícil é pensarmo-nos fora das estruturas actuais do nosso pensamento.
A dificuldade pode ser essa.

É ainda o prazer do texto.

16 comments:

peciscas said...

Embora esteja longe de ser uma pessoa versada nessa área, sempre me atraiu o regresso aos tempos idos.
Quando visito, por exemplo os chamados "lugares históricos", quando leio alguma narrativa histórica, por exemplo, dou por mim a tentar situar-me nesses tempos. O que pensariam os homens e mulheres dessa época? Quais os seus medos, as suas alegrias, os seus encantamentos?
Mas isso, como dizes, é extremamente difícil já que veremos sempre esses tempos com os olhos de hoje. Então, esse recuo, será sempre um exercício algo irreal.

sisifo said...

Difícil discernir entre realidade e ficção. Vemos que são coisas diferentes mas de tal maneira enlaçadas que hesitamos sempre sobre o lugar onde estamos. O teu texto gerou o meu. Pouco depois pensei que talvez se possa pensar nestas coisas como objectivos para o futuro, utopias. A História, consiga ou não, tem por objectivo a verdade e o real, vive do tempo que é em simultâneo o seu financiador e adversário. A ficção tem por objectivo a fantasia, total e sem concessões; não é por isso programática e cria o seu próprio tempo. Vejo-te como detective separando átomo a átomo o que é dum lado e de outro. E ao mesmo tempo a perversidade de ter na mão o segredo e não o revelar.

Elipse said...

Puxas sempre às tuas preferências, Pirata.
Neste momento o que me interessa é mais a forma como o rei/reino mais rico da cristandade se pensa a si próprio, nem que seja por uma escassa década. É impossível apropriarmo-nos da utensilagem mental de outras eras. Mas é bonito.
E Sísifo, obrigada pelo empurrão que deste à pedra. E verás que há sempre surpresas no caminho... nada de últimas frases.
Peciscas, quando eles escreveram as suas narrativas já estavam a lançar o seu olhar sobre a realidade e, com isso, a interpretá-la. E nós com a ilusão de a captarmos!!!

Elipse said...

Gosto sempre das reflexões aqui expressas. Todas. E nem é meu hábito responder, embora reconheça as vantagens deste diálogo para quebrar equívocos.
Talvez hoje esteja a precisar de dialogar, sim. E nesse caso todas os complementos de curiosidade e interesse são bem vindos.

Elipse said...

Lugar de chegada das especiarias... destronou Antuérpia. Mas foi efémero o momento. Eram mercadorias cobiçadas na Europa, como sabes e a Rota do Cabo transferiu momentaneamente para Lisboa o centro da economia-mundo (V. Magalhães Godinho)
Contudo, que estávamos à margem das ondas de choque provocadas pela ruptura luterana. As grandes questões intelectuais decidiam-se na Europa do Centro. Aqui era o poder da pimenta ( e na Espanha o da prata), que acabou por inflacionar os preços e fazer ressentir toda a economia europeia.
Fica, ainda assim, a ideia de um rei que tinha o seu paço situado sobre a Casa da índia, ali no terreiro do paço, e que, da sua casa, via chegar oa barcos carregados e sentia o cheiro da pimenta, que devia tresandar naquela Lisboa suja...
Damião de Góis, pirata. Entre outros.

Mónica said...

iluminuras

addiragram said...

Qual o ponto de encontro entre a busca " impossível" da objectividade e a lente inevitável da subjectividade?
Alguma vez a desmontagem desse presente poderá deixar de conter o olhar do nosso presente?
Questões que de põem na História mas tb em domínios outros do saber...

mfc said...

Há sempre um presente construído. Não existe um presente real objectivado. Todo o presente é invenção... só em retrospectiva o podemos reconhecer como real. É essa a função do historiador.

Mónica said...

não sejas tão intelectual vem cá responder ao desafio em
http://semcantigas2.blogspot.com/2006/02/estranhos-hbitos.html
hehehe
:-)

Maria do Rosário Sousa Fardilha said...

e constato que continuas a suscitar debates nada fáceis... epistemologia na blogosfera! tomem lá! :)

Lúcia said...

estas tertúlias agradam-me, mas detesto história. nunca me recompus dos meus tempos de liceu. há coisas que ficam para sempre.

lembrei-me agora que li, há uns tempos largos atrás, uns livros do João de Aguiar, que se situavam nos primórdios da nacionalidade. e gostei, confesso.
mas ficou por aí, continuo a não gostar de história.
e podem chamar-me ignorante, não me incomoda mesmo nada.
e admiro quem aprecia e partilha os conhecimentos.

Claudia Sousa Dias said...

Eu também adoro romance histórico,sobretudo se o tom da narrativa for autobiográfico, mesmo que se trate de pura ficção. É por isso que "Memórias de Adriano" de Marguerite yourcenas e "Memórias de Agripina" bem como "Crónica esquecida de El rei D. João II" ambos de Seomara da Veiga Ferreira são alguns daqueles que tenho forçosamente que destacar não só pelo rigor histórico como pela beleza da prosa...

E aprovo inteiramente a escolha da Lima para iniciação ao romance histórico, principalmente para quem apanhou alguns traumas no liceu. "A voz dos deuses" e "Uma deusa na bruma" são uma delicia para abrir o apetite aos futuros amantes da História!


CSD

Lúcia said...

agora é que foi, Pirata. História.... em Castelhano????
Ai meus deuses!!!!!!!!!!!!
Não penses que não vou tomar nota.
Amazon, me eis!

Lúcia said...

amazon não se compromete, fnac.es não tem, fnac.pt não conhece e bertrand.pt idem!
alguém vai ter trabalho!

Lúcia said...

uma coisa conseguiste, Pirata. Fui ver ao meu "projecto" de biblioteca e na secção de história/religiões, onde nunca vou, encontrei um livro de Bernard Reilly, "Cristãos e muçulmanos - a luta pela Península Ibérica". Foi directo para a mesinha de cabeceira. Não sei se vou lê-lo de fio a pavio, mas já li algumas páginas. E pode ser que me surpreenda.

Elipse said...

Gostei de vos ver à vontade na minha sala de visitas. Voltem sempre e tragam boas sugestões.