Sunday, October 30, 2005

Novelo Triste



A Hipatia da Voz em Fuga, lançou um desafio, a partir deste desenho.

Porque estás triste? Não te dei já o sumo de laranja que querias?

Respondi...

Gosto de coisas puras, perfeitas, autênticas.
Não suporto que me enganem, que finjam gostar de mim ou do que eu faço com dizeres amáveis, prestáveis, insuportáveis.
Por que vieste com a conversa do sumo? Mais parecias um miúdo inseguro nos actos, inconsequente, carente de mãos meladas.
Respeita as minhas lágrimas; há dias em que precisamos de ver a nossa tristeza inundar os céus, afrontar os deuses, fazer-se matéria inteira, grosseira, gume afiado sobre uma pele desbotada.
Não me toques nos cabelos; deixa-me sentir que estou só comigo, não quero ânimo servido em mãos adoçadas, enganadas de tanto pensar que podem salvar os outros das suas grades antigas.
Não me olhes, não me estendas um copo da cor das chamas; deixa-me arder por dentro que rebento se não consumo este sentir angustiado. Já me vi ao espelho, não precisas de me lembrar que o canto é grito calado; são assim os cantos dos meus olhos quando estou triste. O mais certo é teres andado desatento se nunca viste como sou planta sem viço.
Seguro o meu pé, viste bem; é certamente porque me enrolo neste feitiço de ser assim. Ser coisa pura, nua, talvez novelo. Assumo.

6 comments:

Maria do Rosário Sousa Fardilha said...

belo queixume, amiga! belo! :)

Tino said...

Mesmo assim acho que ainda há mais qualquer coisa na expressão da rapariga...tem o ar de quem está prestes a tomar uma decisão...um beijinho grande :)

mfc said...

Agreste, inconformado, sarcástico e lindamente construído.

jp(JoanaPestana) said...

o novelo, sim é o novelo.
Beijinho

Hipatia said...

Reconheço o estilo que me fez votar no teu texto, a quando do último concurso do Escritor Famoso. E gosto. Muito! Especialmente da forma muito pessoal como devolves por palavras os sentimentos que as imagens te transmitem. E a riqueza do teu olhar deixa-me sempre perplexa.

Obrigada por participares :)

Graca Neves - mgbon said...

Não há nada pior que o fazer de conta, a indiferença.
Os afectos têm que ser como o sumo de laranja...naturais.