Monday, January 16, 2006

Estavam sentados lado a lado e era Verão...


Estavam sentados lado a lado e era Verão...


Comecei a escrever...
Porém nem as cores me inspiravam e tudo ia parar ao lugar das ausências. Depois pensei que outros fariam melhor. Enquanto vou pensando noutro texto, aguardo os vossos...
(Podem deixá-los nos comentários. Eu passo-os para aqui).


E escrevi...

Sentavam-se lado a lado e era cedo. Roubavam o brilho ao sol e escreviam Futuro com as cores do Verão. Depois apertavam as mãos e percorriam em voo harmonioso todas as certezas.
Descobriam, ainda, as primeiras estrelas e, em segredo, os espelhos dos olhos diziam Desejo.
Dali seguiram para os mares e fizeram viagens. Primeiro os navios eram robustos e voltavam sempre ao cais. Aos poucos as amarras ensaguentavam os pulsos e doía ficar. E doía partir.
Passadas as estações do Tempo ainda os viram sentados lado a lado. E apertavam as mãos. Mas já se escapavam delas as certezas e os olhos, que eram espelhos, reflectiam suspiros secos.

Disseram depois que as cadeiras permaneceram no mesmo lugar. E que os olhos dela reflectiram todas as cores do verão quando se sentou.




À sombra, enviado pela Wind

Mas onde estavam, por baixo daquela sombra, fazia fresquinho. Era um casal dos seus cinquenta anos, com os filhos já criados e casados.Viviam agora a paz de umas merecidas férias. Ele parou de ler o jornal e olhou-a. Pensou em como ainda amava aquela mulher, mesmo depois de 28 anos de casados. Não se via sem ela. Ela sentiu o olhar dele, sorriu e encostou a sua cabeça ao braço dele. Deram as mãos e em silêncio foram mais uma vez cúmplices do amor.

E a Ivamarle deu sequência ao tema:

...e apreciavam ambos o voo das aves que ele ia identificando, com o seu olhar educado para o reconhecimento delas, pelo voar, pelo piar, e ia descrevendo o que faziam: - olha aquele é um macho e está a tentar acasalar; aquela ali é uma fêmea, vês o que leva no bico? são materiais para construir o ninho... - são tão lindos - dizia ela- não entendo como consegues identificá-los a uma tão grande distância. - é facil, dizia, olha as cores e o bater das asas, são tão diferentes umas das outras, bem como o piar de cada uma delas, já reparaste que mudam consoante, estão a acasalar ou simplesmente a defender o ninho? - há anos que tento distinguir, mas confesso que não consigo educar o ouvido ou o olhar para isso; no entanto admiro-as, como admiro o teu conhecimento desses pormenores.- ao fim de 24 anos ainda me admiras? perguntou com um sorriso trocista?- admiro sobretudo a tua persistência em aturar-me há tantos anos, e responderes com carinhos aos meus maus humores...- sabes, disse ele, eu sou como os pombos.- como os pombos? inquiri...- sim, quando acasalam é para toda a vida.

E a Fatyly escreveu também:


Olho através da vidraça do meu quarto. A buganvília sempre florida, pintada como só ela sabe fazer e tentando chamar a atenção de quem a observa. As cadeiras vazias, as mesmas cadeiras que o tempo jamais destruiu. Lembranças...- Manel, já viste como o tempo passa? Ainda há pouco os filhos andavam por aqui! - Oh Maria deixa-os lá viver a vida deles e não tarda aparecem aí com os netos! Hoje é domingo e está um dia tão lindo! - Tu quando estás a ler o jornal és um xato não me ligas nenhuma.Manel na sua infinita calma, tira os óculos, dobra o jornal, ajeita os cabelos brancos, enche o peito de ar, olhos de carneiro mal morto e com as suas mão calejadas... retira do colo os trapos que Maria cosia a abraçou-a. - Maria tu continuas linda, ainda me lembro do primeiro beijo, queres fazer amor, ou melhor como dizem os nossos filhos...queres dar uma keka?? - Aqui? Tu és doido? Larga-me pá, mas agora deu-te p'ra isso, já vistes que falas como eles? - Sabes que sempre fui louco por ti e tu por mim não é e o amor não tem idade não é?- Se tivesses dúvidas não estavas aqui pois não? Manel...olha os vizinhos, tem juízo homem de Deus e se os filhos aparecem? - A!AH!AH! e que importa? ‘Tá um calor tão gostoso e eu gosto tanto de ti! A bunganvília começou a abanar-se com uma aragem tão aconchegante e sobre ambos deixou cair algumas florzinhas abençoando aquela união de corpos e almas, sem idades, sem tabus, o mundo era apenas dos dois. Os filhos entraram e ao verem... deixaram-nos na sua felicidade, porque Manel e Maria estavam na sua cumplicidade, entrega, carinho e amor...tanto amor! - Gostaste Maria? - Gostaste Manel? Silenciosamente levantaram-se, recompuseram-se e de mãos dadas entraram em casa onde foram recebidos com aplausos e numa só voz: papá e mamã não cuscamos nada, respeitámos a vossa privacidade... aguardamos aqui dentro, porque quando se ama... todos os lugares são nossos, tão nossos e de mais ninguém! Parabéns Pai parabéns Mãe e obrigado por serem tão felizes!

Os vidros da janela ficaram embaciados pelas minhas lágrimas... Manel porque deixaste-me tão sozinha? Os filhos pintaram tudo, mas deixaram p'ra sempre aquele canto, como um santuário.Vou fazer o almoço, pois os cinco netos vêm almoçar e têm escola de tarde! Depois mais loguinho venho falar contigo Manel e relembrar vivências tão nossas! Beijos meu AMOR!

Nota: estou com um problema no espaçamento das linhas... tem de ficar assim, espero que não se importem.

Depois veio a Stela, assim:

Sentavam-se ali há anos, os dois, sempre os dois... primeiro sós, enamorados e ofuscados pela presença do outro. Mais tarde vieram os filhos e alternavam então entre as cadeiras e as brincadeiras dos miúdos, sempre com pedidos: - Pai vem jogar à bola... Enquanto isso, as cadeiras ficavam vazias, a Mãe preparava o jantar. Os miúdos foram crescendo... naquelas cadeiras, teceu-se o futuro imaginário dos filhos, discutiu-se a educação, sonhou-se o futuro, chorou-se o passado... quando ficaram sós novamente, as cadeiras voltaram a desempenhar o papel fundamental de sempre nas suas vidas... nessa altura, já não tecia o futuro dos filhos, já então construido por eles, sonhava-se então com os netos, que depressa vieram... os anos passaram, passaram tão rápido, que hoje de toda uma vida, feita de sonhos e castelos, restaram as cadeiras para os imortalizar...

E o Prólogo escreveu os Efeitos:

Estavam sentados lado a lado e era Verão. No Outono sentavam-se frente a frente e no Inverno costas com costas. Na Primavera não se sentavam. Andavam pelas bermas dos passeios e ora num pé ora noutro, iam gastando a alegria em passos de dança e variações sobre dois corpos.

Estavam sentados lado a lado porque era Verão. Não por causa dos excessos da estação, do calor , da luz, do aroma, da indolência. Por uma razão habitual. Por uma razão nenhuma. Porque assim olhavam na mesma direcção e é provável, deve mesmo estar demonstrado, por algum monstro, que no Verão os dois olham para a mesma imagem. Propensão genética, impulso divino, força astral, tradição, o escudo da sombra, a boca que fala e o ouvido que ouve.

Estavam sentados lado a lado porque era Verão. Não sei que Verão. Não sei o que verão daquele lugar sentado que é quase sempre o lugar da espera. Mas estavam sentados lado a lado. Quando, no Outono se sentavam frente a frente era para se olharem um ao outro, fixamente, deliberadamente à procura do mistério. Porque há no Outono de cada um um mistério que é mistério para o próprio e revelação para o outro. No Inverno, costas com costas, olhavam para sentidos opostos mas os sentidos libertos da pressão omnipotente do olhar, sentiam com mais intensidade e escorraçavam o frio que penetrava ameaçador pela frincha da porta.

Estavam sentados lado a lado e era Verão. Poderia ter sido ao contrário, poderia ter sido de muitas maneiras diferentes. Mas o Verão era depois da Primavera, depois dos saltos pueris que os faziam dispensar os assentos e em que o alvoroço que brotava da terra parecia chamar às coisas alegria.

Estavam sentados lado a lado e era Verão. Era por estarem sentados lado a lado que era Verão.

E a j.p. , do Faz de Conta, também colaborou:

O cheiro da buganvília entra-me sem pudor nos sentidos. Reporta-me a cheiros de terra nuances de doces mel. No tempo das fugas rápidas, era a enterrar as mãos nuas na terra, que a harmonia e o contraste me paravam no tempo que teimava em andar depressa demais. E todos os dias a espiava, certa de que o meu olhar guardião a estimulava a crescer. E todos os anos floriam, uma e outra camada de papel lilás. Nunca me sentei debaixo dela na invasão do seu espaço. E agora que a vejo por detrás do muro, sorrio. E penso sempre, se um dia alguém se interrogará, corpo num lado e pés no outro das cadeiras brancas, quem foi o jardineiro de pés descalços e óculos de sol que a plantou.


A Maria, das Estórias do Bicho da seda, escreveu um "conto" :

Estavam sentados lado a lado e era Verão...aquele Verão que mudou para sempre as suas vidas e a sua forma de olhar o mundo.
Artur estava tão bem humorado que, no entusiasmo dos seus vinte e quatro anos, o mundo lhe parecia um lugar quase perfeito. Segurando com carinho na mão de Matilde, que estava a um mês de se tornar sua mulher, levava-a numa visita guiada ao futuro imaginado, sob aquelas bungavílias que lhes conheciam todos os segredos e sobre as quais a PIDE/DGS nunca tivera ascendência alguma.
A revolução de Abril trouxera-lhes potencialidades nunca sonhadas. O clima de alegria com a liberdade recém conquistada impregnava-se no sangue e na alma de um povo inteiro e todos os sonhos pareciam agora possíveis. Artur conseguira trabalho como jornalista num novo jornal havia dois meses e sonhava com o tempo em que a gerência o viesse a enviar como correspondente ao estrangeiro. Matilde acompanhá-lo-ia para todo o lado como já fazia agora, a menos, claro, que o jornalismo não a interessasse e se quisesse dedicar ao seu objectivo de fundar uma pequena editora.
Matilde ria-se, contagiada pela alegria do seu amor e pelo optimismo dos seus dezanove anos, que queria ainda estudar Letras e depois se veria. Mas então e hoje, não tens trabalho para fazer? Ah sim, claro (naquele seu jeito sempre despreocupado), tenho uma delegação do PCP para entrevistar. Aliás, o plano para os próximos dias é falar com representantes locais de todos os partidos e recolher as suas opiniões sobre como o país deve ser gerido. Agora todos têm direito a ser ouvidos, tal como antes todos tinham o direito de se reduzirem ao silêncio. Mas vens comigo, claro! Preciso da minha assistente e da minha musa, além de que a tua curiosidade é sempre uma mais valia, quando não é inconveniente...
Fingindo-se amuada com o comentário ela abandonou um tanto ou quanto relutantemente a sombra das bungavílias e foi preparar as suas coisas. Daí a pouco iam os dois na motoreta emprestada pelo futuro sogro a caminho da tal delegação regional do PCP, as cabeças já fervilhando de perguntas sobre as medidas práticas que aquele partido pensava implementar. Nenhum deles tinha qualquer filiação política, achavam-se livres pensadores e gostavam de analisar primeiro todas as variantes e só depois escolher. Apesar de todo o seu entusiasmo e fé no futuro Artur trazia no fundo de si uma sombra plantada por alguns excessos que já tinha presenciado. Uma parte podia ser atribuída ao facto de as pessoas depois de tanto controlo durante tantos anos se verem subitamente livres e, tal como um filho finalmente longe da disciplina dos pais, a liberdade sobe à cabeça. Mas ele temia que os excessos se tornassem o sistema e que afinal alguns entendessem apenas substituir uma ditadura por outra.
Ninguém lhes cantou o Grândola Vila Morena na recepção, mas foram recebidos com o título de camaradas e com abraços como se fossem conhecidos há longos anos. Havia bandeiras vermelhas por todo o lado e era notório o entusiasmo dos camaradas que por ali se encontravam.
A entrevista, contudo, nunca chegou a ocorrer. Enquanto Matilde analisava umas fotografias da Revolução numa das paredes e Artur voltava à motoreta para ir buscar o saco onde transportava o material fotográfico, houve uma explosão junto à secretária do entrevistado. Matilde pouco sofreu, praticamente apenas ficou em estado de choque com o susto e com o horror do que viu depois, apesar de Artur ter sabido por um amigo seu da polícia que houvera um problema na detonação da bomba que, da forma que tinha sido preparada, deveria ter provocado muito mais estragos.
Artur teve, naquele dia, informação que não procurava. E, contra aquilo em que acreditava – que a informação devia ser apresentada tal como era, preto no branco, sendo as opiniões mencionadas em artigos próprios para o efeito – viu o seu artigo modificado pelo redactor-chefe, transformado num relato na primeira pessoa, manifestando opiniões que nem sequer eram as suas, como aliás era característico de todos os grandes jornais da época.
Mas, mais do que tudo, incomodava-o uma coisa – que liberdade era esta, que se tinha conquistado sem o peso da morte e do sangue e em que agora se espezinhavam cravos e vidas?
Desiludidos com o caminho que as coisas tomavam e por verificarem que ninguém parecia interessado em apurar a verdade dos factos, já que a investigação sobre o que acontecera não chegou a conclusão nenhuma que não fosse o óbvio, acabaram por tornar-se ambos jornalistas de investigação, determinados a evitar que certas verdades ficassem reduzidas a pó e silêncios comprometidos.
Casaram sim, e foram felizes. Mas a sombra daquelas bungavílias nunca mais lhes conseguiu devolver a paz da inocência roubada.




27 comments:

Toze said...

Vou aguardar pelos escritos , Elipse :))

Beijo grande:)

Berenice said...

Também fico a aguardar... A foto é verdadeiramente inspiradora! Não vai ser difícil... Força!

wind said...

À sombra

Mas onde estavam, por baixo daquela sombra, fazia fresquinho.
Era um casal dos seus cinquenta anos, com os filhos já criados e casados.
Viviam agora a paz de umas merecidas férias.
Ele parou de ler o jornal e olhou-a.
Pensou em como ainda amava aquela mulher, mesmo depois de 28 anos de casados.
Não se via sem ela
Ela sentiu o olhar dele, sorriu e encostou a sua cabeça ao braço dele.
Deram as mãos e em silêncio foram mais uma vez cúmplices do amor.

ivamarle said...

e apreciavam ambos o vôo das aves que ele ia identificando, com o seu olhar educado para o reconhecimento delas, pelo voar, pelo piar, e ia descrevendo o que faziam:
-olha aquele é um macho e está a tentar acasalar; aquela ali é uma fêmea, vês o que leva no bico? são materiais para construir o ninho...
-são tão lindos-dizia ela- não entendo como consegues identificá-los a uma tão grande distância.
- é facil, dizia, olha as cores e o bater das asas, são tão diferentes umas das outras, bem como o piar de cada uma delas, já reparaste que mudam consoante, estão a acasalar ou simplesmente a defender o ninho?
- há anos que tento distinguir, mas confesso que não consigo educar o ouvido ou o olhar para isso; no entanto admiro-as, como admiro o teu conhecimento desses pormenores.
- ao fim de 24 anos ainda me admiras? perguntou com um sorriso trocista?
- admiro sobretudo a tua persistência em aturar-me há tantos anos, e responderes com carinhos aos meus maus humores...
- sabes, disse ele, eu sou como os pombos.
- como os pombos? inquiri...
- sim, quando acasalam é para toda a vida.

Anonymous said...

Olho através da vidraça do meu quarto. A buganvília sempre florida, pintada como só ela sabe fazer e tentando chamar a atenção de quem a observa.
As cadeiras vazias, as mesmas cadeiras que o tempo jamais destruiu. Lembranças...

- Manel, já viste como o tempo passa? Ainda há pouco os filhos andavam por aqui!
- Oh Maria deixa-os lá viver a vida deles e não tarda aparecem aí com os netos! Hoje é domingo e está um dia tão lindo!
- Tu quando estás a ler o jornal és um xato não me ligas nenhuma.
Manel na sua infinita calma, tira os óculos, dobra o jornal, ajeita os cabelos brancos, enche o peito de ar, olhos de carneiro mal morto e com as suas mão calejadas... retira do colo os trapos que Maria cozia a abraçou-a.
- Maria tu continuas linda, ainda me lembro do primeiro beijo, queres fazer amor, ou melhor como dizem os nossos filhos...queres dar uma keka??
- Aqui? Tu és doido? Larga-me pá, mas agora deu-te p'ra isso, já vistes que falas como eles?
- Sabes que sempre fui louco por ti e tu por mim não é e o amor não tem idad não é?
- Se tivesses dúvidas não estavas aqui pois não? Manel...olha os vizinhos, tem juízo homem de Deus e se os filhos aparecem?
- A!AH!AH! e que importa? Tá um calor tão gostoso e eu gosto tanto de ti!
A bunganvília começou a abanar-se com uma aragem tão aconchegante e sobre ambos deixou cair algumas florzinhas abençoando aquela união de corpos e almas, sem idades, sem tabus, o mundo era apenas dos dois.
Os filhos entraram e ao verem...deixaram-nos na sua felicidade, porque Manel e Maria estavam na sua cumplicidade, entrega, carinho e amor...tanto amor!
- Gostastes Maria?
- Gostastes Manel?
Silenciosamente levantaram-se, recompuseram-se e de mãos dadas entraram em casa onde foram recebidos com aplausos e numa só vós: papá e mamã não cuscamos nada, respeitámos a vossa privacidade...aguardamos aqui dentro, porque quando se ama...todos os lugares são nossos, tão nossos e de mais ninguém!
Parabéns Pai parabéns Mãe e obrigado por serem tão felizes!

Os vidros da janela ficaram embaciados pelas minhas lágrimas... Manel porque deixastes-me tão sózinha?

Os filhos pintaram tudo, mas deixaram p'ra sempre aquele canto, como um santuário.

Vou fazer o almoço, pois os cinco netos vêm almoçar e têm escola de tarde!
Depois mais loguinho venho falar contigo Manel e relembrar vivências tão nossas!
Beijos meu AMOR!

Maria do Rosário Sousa Fardilha said...

dá-me um tempo... ;)

Anonymous said...

Por mim não há problema! Tá óptimo mas adoro ler os vários sentimentos que uma simples foto provoca. Parabéns pelo desafio e por este teu cantinho! Beijocas a todos

Chulé said...

Olá, Cheguei aqui por acaso através do Ministério da Soltura, também posso mandar um texto? Posso?

Lúcia said...

belo desafio. mas deixo para outros, nem me atrevo a competir com tanta gente que escreve tão bem....

stela said...

Sentavam-se ali há anos, os dois, sempre os dois... primeiro sós, enamorados e ofuscados pela presença do outro. Mais tarde vieram os filhos e alternavam então entre as cadeiras e as brincadeiras dos miúdos, sempre com pedidos:
- Pai vem jogar à bola...
Enquanto isso, as cadeiras ficavam vazias, a Mãe preparava o jantar.
Os miúdos foram crescendo... naquelas cadeiras, teceu-se o futuro imaginário dos filhos, discutiu-se a educação, sonhou-se o futuro, chorou-se o passado... quando ficaram sós novamente, as cadeiras voltaram a desempenhar o papel fundamental de sempre nas suas vidas... nessa altura, já não tecia o futuro dos filhos, já então construido por eles, sonhava-se então com os netos, que depressa vieram... os anos passaram, passaram tão rápido, que hoje de toda uma vida, feita de sonhos e castelos, restaram as cadeiras para os imortalizar...

Anonymous said...

Efeitos

Estavam sentados lado a lado e era Verão. No Outono sentavam-se frente a frente e no Inverno costas com costas. Na Primavera não se sentavam. Andavam pelas bermas dos passeios e ora num pé ora noutro, iam gastando a alegria em passos de dança e variações sobre dois corpos.

Estavam sentados lado a lado porque era Verão. Não por causa dos excessos da estação, do calor , da luz, do aroma, da indolência. Por uma razão habitual. Por uma razão nenhuma. Porque assim olhavam na mesma direcção e é provável, deve mesmo estar demonstrado, por algum monstro, que no Verão os dois olham para a mesma imagem. Propensão genética, impulso divino, força astral, tradição, o escudo da sombra, a boca que fala e o ouvido que ouve.

Estavam sentados lado a lado porque era Verão. Não sei que Verão. Não sei o que verão daquele lugar sentado que é quase sempre o lugar da espera. Mas estavam sentados lado a lado. Quando, no Outono se sentavam frente a frente era para se olharem um ao outro, fixamente, deliberadamente à procura do mistério. Porque há no Outono de cada um um mistério que é mistério para o próprio e revelação para o outro. No Inverno, costas com costas, olhavam para sentidos opostos mas os sentidos libertos da pressão omnipotente do olhar, sentiam com mais intensidade e escorraçavam o frio que penetrava ameaçador pela frincha da porta.

Estavam sentados lado a lado e era Verão. Poderia ter sido ao contrário, poderia ter sido de muitas maneiras diferentes. Mas o Verão era depois da Primavera, depois dos saltos pueris que os faziam dispensar os assentos e em que o alvoroço que brotava da terra parecia chamar às coisas alegria.

Estavam sentados lado a lado e era Verão. Era por estarem sentados lado a lado que era Verão.

Prólogo

mfc said...

Não tenho pedalada, mas sei apreciar... e estou a gostar muito.
Qualquer estação é boa desde que estejamos bem, mas distingo SEMPRE o Outono.

jp(JoanaPestana) said...

Elipsemenina, vá lá buscá-lo que ando preguiçosa, please.
Beijo

Luna said...

É bom sentar-me aqui a ler-te(vos)
Beijo Elipse

mixtu said...

qu eexcelente ideia
yayayya...
hoje estou doentito mas prometo escrever

Carlos Azevedo said...

É aqui o concurso ? Estou atrasado ou ainda posso participar?

Elipse said...

bóra lá...
Prometo que depois, seguindo os meus critérios de avaliação, selecciono o melhor texto. Ou ponho à votação??? Que acham?

wind said...

Faz o que achares mais justo:)

mfc said...

Deves ser tu a seleccionar... não passes a batata quente para os outros...eheheheheeh!

Anonymous said...

Caramba, coloquei isto nos sítio errado...

"Pois, pois...não quero participar em concurso nenhum, mas tenho uma contribuição para ti que está no forno. Talvez durante o dia consiga, senão amanhã de manhã...Umm beijo especial para ti que me "obrigas" a fazer uma das coisas que mais gosto, mas que coloco atrás de todas as obrigações a maior parte das vezes - escrever, claro! "

Anonymous said...

E cá está...

Estavam sentados lado a lado e era Verão...aquele Verão que mudou para sempre as suas vidas e a sua forma de olhar o mundo.

Artur estava tão bem humorado que, no entusiasmo dos seus vinte e quatro anos, o mundo lhe parecia um lugar quase perfeito. Segurando com carinho na mão de Matilde, que estava a um mês de se tornar sua mulher, levava-a numa visita guiada ao futuro imaginado, sob aquelas bungavílias que lhes conheciam todos os segredos e sobre as quais a PIDE/DGS nunca tivera ascendência alguma.

A revolução de Abril trouxera-lhes potencialidades nunca sonhadas. O clima de alegria com a liberdade recém conquistada impregnava-se no sangue e na alma de um povo inteiro e todos os sonhos pareciam agora possíveis. Artur conseguira trabalho como jornalista num novo jornal havia dois meses e sonhava com o tempo em que a gerência o viesse a enviar como correspondente ao estrangeiro. Matilde acompanhá-lo-ia para todo o lado como já fazia agora, a menos, claro, que o jornalismo não a interessasse e se quisesse dedicar ao seu objectivo de fundar uma pequena editora.

Matilde ria-se, contagiada pela alegria do seu amor e pelo optimismo dos seus dezanove anos, que queria ainda estudar Letras e depois se veria. Mas então e hoje, não tens trabalho para fazer? Ah sim, claro (naquele seu jeito sempre despreocupado), tenho uma delegação do PCP para entrevistar. Aliás, o plano para os próximos dias é falar com representantes locais de todos os partidos e recolher as suas opiniões sobre como o país deve ser gerido. Agora todos têm direito a ser ouvidos, tal como antes todos tinham o direito de se reduzirem ao silêncio. Mas vens comigo, claro! Preciso da minha assistente e da minha musa, além de que a tua curiosidade é sempre uma mais valia, quando não é inconveniente...

Fingindo-se amuada com o comentário ela abandonou um tanto ou quanto relutantemente a sombra das bungavílias e foi preparar as suas coisas. Daí a pouco iam os dois na motoreta emprestada pelo futuro sogro a caminho da tal delegação regional do PCP, as cabeças já fervilhando de perguntas sobre as medidas práticas que aquele partido pensava implementar. Nenhum deles tinha qualquer filiação política, achavam-se livres pensadores e gostavam de analisar primeiro todas as variantes e só depois escolher. Apesar de todo o seu entusiasmo e fé no futuro Artur trazia no fundo de si uma sombra plantada por alguns excessos que já tinha presenciado. Uma parte podia ser atribuída ao facto de as pessoas depois de tanto controlo durante tantos anos se verem subitamente livres e, tal como um filho finalmente longe da disciplina dos pais, a liberdade sobe à cabeça. Mas ele temia que os excessos se tornassem o sistema e que afinal alguns entendessem apenas substituir uma ditadura por outra.

Ninguém lhes cantou o Grândola Vila Morena na recepção, mas foram recebidos com o título de camaradas e com abraços como se fossem conhecidos há longos anos. Havia bandeiras vermelhas por todo o lado e era notório o entusiasmo dos camaradas que por ali se encontravam.

A entrevista, contudo, nunca chegou a ocorrer. Enquanto Matilde analisava umas fotografias da Revolução numa das paredes e Artur voltava à motoreta para ir buscar o saco onde transportava o material fotográfico, houve uma explosão junto à secretária do entrevistado. Matilde pouco sofreu, praticamente apenas ficou em estado de choque com o susto e com o horror do que viu depois, apesar de Artur ter sabido por um amigo seu da polícia que houvera um problema na detonação da bomba que, da forma que tinha sido preparada, deveria ter provocado muito mais estragos.

Artur teve, naquele dia, informação que não procurava. E, contra aquilo em que acreditava – que a informação devia ser apresentada tal como era, preto no branco, sendo as opiniões mencionadas em artigos próprios para o efeito – viu o seu artigo modificado pelo redactor-chefe, transformado num relato na primeira pessoa, manifestando opiniões que nem sequer eram as suas, como aliás era característico de todos os grandes jornais da época.

Mas, mais do que tudo, incomodava-o uma coisa – que liberdade era esta, que se tinha conquistado sem o peso da morte e do sangue e em que agora se espezinhavam cravos e vidas?

Desiludidos com o caminho que as coisas tomavam e por verificarem que ninguém parecia interessado em apurar a verdade dos factos, já que a investigação sobre o que acontecera não chegou a conclusão nenhuma que não fosse o óbvio, acabaram por tornar-se ambos jornalistas de investigação, determinados a evitar que certas verdades ficassem reduzidas a pó e silêncios comprometidos.

Casaram sim, e foram felizes. Mas a sombra daquelas bungavílias nunca mais lhes conseguiu devolver a paz da inocência roubada.


Foi o que se pôde arranjar...acho que acabei por corromper a paz das tuas lindas bungavílias, tem paciência... Beijinhos!

Graca Neves - mgbon said...

Que bela ideia!

Mónica said...

tu é que és batoteira: sentas-te à sombra lado a lado com a amiga preguiça de apelido falta de imaginação e de lá, da sombra, sob o cheiro das flores de verão, convidas-nos, os que andamos escrevendo de pé, de sol a sol em inverno frio e chuvoso, produzindo produzindo textos de tua conveniência!

Luna said...

Elipse, passa aí o café e os biscoitos sff....

Elipse said...

O tempo nunca é elástico, Luna.
Mas o filme segue já...
Terei todo o gosto do mundo em servir café e biscoitos (reais) um dia destes em minha casa.

Elipse said...

Foi mesmo batota, cantiguita.
Também já estava farta de ver as buganvílias, confesso, embora cortassem um pouco o efeito do frio.
Agradeço,pois, as contribuições de toda a gente e sigo já.

Anonymous said...

demorou mas foi. já está lá um texto na minha tasquinha... :)