Tuesday, August 09, 2005

Divagando sobre a verdade

Gostava de equacionar a palavra Verdade numa fórmula perfeita, inalterável, mestra.
Para isso teria de entrar no mundo dos números, mundo racional, mundo de realidades apinhadas de vértices e arestas laminares ligadas seguramente por uma lógica e uma coerência interna que me escapa ao entendimento.
Terei, então, de entrar no mundo das palavras e ficcionar com elas (ficção é fingere, fazer) uma construção que arrume e organize a relação com o real.

Vamos ver:

- O presente é um lapso, um momento que se fez passado;
- O real passado já não existe. Lembrá-lo é entrar no domínio da representação porque todo o momento é irrecuperável, impossível de presentificar;
- Representar o momento é arrumá-lo no tempo, porque dentro da memória tudo se mistura em ritmos tão diversos, que a tarefa de o trazer ao presente falha, surgindo ele já como outra coisa, diversa do que tinha sido;
- Entre o real e a sua representação esvaiu-se o empírico; transfigurou-se o momento e o que daí resulta é uma versão que podemos sempre contar de outra maneira:

* Podemos iniciar o relato in medias res (na vida está-se sempre no meio!) e organizar tudo de uma forma harmoniosamente inteligível;

* Podemos também começar in ultimas res, invertendo o real, usando as analepses, em conjunto com a experiência que a chegada nos confere;

* Podemos até começar pelo “era uma vez”… mas com a consciência de que o início já começou no meio de qualquer coisa que era o fim da outra.

Dado que o papel do leitor é dar ao texto uma dimensão semântica, facilmente se deduz que a apreensão da verdade que aqui fizeste, leitor das minhas divagações, é única e apenas tua.
Dado, ainda que sobrevives da lógica e da racionalidade, (verdades muito frias para o meu entendimento), deduzo que terás chegado ao exacto ponto de partida:

Quid veritas

Que concluir, então, destas linhas filosófica e literariamente construídas sobre equações imperfeitas, análogas em tudo ao real guardado na memória?


Apenas isto: A VERDADE NÃO EXISTE

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