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A memória fica frouxa e ao mesmo tempo a saúde declina: hoje doem as mãos, amanhã o corpo e no outro dia já passou tanto tempo, ainda que não se perceba como, porque foi quase ainda ontem que os filhos nasceram e se fizeram homens, cada um com a sua vida e as famílias complicadas, discussões, separações e outras situações; enfim, estamos sós, diz o velho, depois de urinar sangue, desconfiado que a partir de agora não há muito mais a esperar da vida; ela tem mais fibra e estende ainda ao trabalho as mãos e a garra. Sorte a deles, que podem queixar-se um ao outro, as palavras ajudam e a presença alivia a solidão, que mesmo juntos nem sempre a vida foram rosas. Sorte se vivem perto das emergências, se bem que o longe é relativo, dizem os governantes, no meio de inaugurações: hospitais? não nos perguntem essas coisas agora que o tempo é para celebrações e o Alqueva vai dar de beber a muitos milhões. Fome? Isso é conversa das oposições. Doença? Não, não estamos doentes, somamos números em vivas recuperações. Os velhos? Quais velhos? Os velhos já não existem. Falemos de prosperidade que desse assunto já nós cuidámos para bem de todos e da economia das nações.