Tuesday, February 07, 2012

Genocídios e afins


Eu disse que escrevia. E a inspiração não se extinguiu nem a ideia morreu.
O que se passa é que quaisquer palavras ou quaisquer linhas acabam por ir juntar-se à negra disposição que nos é inculcada pela conjuntura de austeridade que sopra dos lados do luteranismo alemão.
Como ela (1), estou plenamente convencida de que a líder espiritual europeia do momento enferma de um provincianismo conservador próprio da educação de Leste e de uma maneira de ser que pressupõe o ódio ao riso. E aqui só me ocorre uma frase de Umberto Eco sobre o riso, citando ele próprio a crença medieval que dizia que "o riso afasta o medo e sem medo não há fé" (2). Medo esse que se traduzia no afastamento de toda a espécie de vontade de saber. Como agora.
Carnavais são tradições a eliminar porque fazem rir; uns cêntimos a mais no bolso para uma noitada de copos é pecado; uma ambulância que faça o caminho para o hospital mais próximo, nem que seja a 50 km de distância por entre montes e vales, é um luxo a retirar do dia a dia; ir de transporte para o trabalho, dentro em breve será tão grave como esbanjar uns cobres num restaurante para comemorar mais um aniversário (ou menos um ano para a reforma, dependendo do ponto de vista). Isto para não falar na compra de um jornal para verificar os anúncios de emprego que não aparecem ou mesmo na compra de um livro para desanuviar um pouco, que a cabeça não aguenta tanta referência a crises, frios polares, sem abrigos a gelar na rua ou gente a matar-se em campos de futebol.
Isto tudo porque ontem ouvi dizer que foi imposto à Grécia o despedimento de mais uns milhares de funcionários públicos. Ou antes, o que eu ouvi foi que a Alemanha mandou matar mais quinze mil gregos. Não em campos de extermínio, mas à fome.


(1) Clara Ferreira Alves, "O fim do mundo num gemido", Expresso, 4/2/2012
(2) Umberto Eco, O Nome da Rosa.