Sunday, October 28, 2007

Hibernação 1.


Talvez hiberne.
Basta reduzir a actividade ao mínimo exigido pela sobrevivência, respirar devagar, deixar o coração bater devagar, sentir baixar a temperatura do corpo, devagar. Ficar assim durante a estação fria, ouvir o cair da chuva ao longe, se houver chuva e deixar passar por cima das palavras adormecidas as folhas velhas.

Friday, October 19, 2007

quadrantes e luas em cruzamentos quase possíveis


Era a propósito dos quadrantes; os do vento e os da vida, que os quatro cantos de tudo são sempre a possibilidade esquartejada, tendo em conta a unidade impossível.
Era possível ter sido diferente, pelo menos na contingência dos “ses”, sendo eles os caminhos excluídos e, só por isso, os que se adivinhariam a alternativa perfeita. Ou a diferença poderia estar nesta consideração, decalcada da rosa-dos-ventos e por isso limitada ao rigor das quartas partes, sendo a vida mais do que isso.
Quatro vezes excluí de mim o quarto crescente. Nem sempre fui voluntária mas, avaliação feita, cruzaram-se o mal e o bem, como se cruza o céu com a terra ou a lua com as marés.
À primeira foi como perder um membro. De vantagem apenas a robustez da cicatriz. Ponto quase final.
Depois a paz, brisa – não vento – a entorpecer até ao excesso. Sossego inquieto depois de quase perfeito.
A meio, a exigência de torvelinhos enviesados, vulcões vindos de dentro, ânsias recalcadas, ousadia, desafio quase completo.
Depois o quarto céu, a zurzir num cais ventoso, quase real.
Assomaram ainda algumas orientações colaterais mas não me lembro do sopro.
O mais, foram quartos minguantes.




Sunday, October 14, 2007

O que foi que eu disse?


Depois passaram dias, muitos dias, disse eu como só os velhos dizem quando contam histórias moídas pelo mofo dos Outonos; e dos dias passados ficaram memórias sopradas pelos ventos de todos os quadrantes; memórias incrustadas na raiz dos anos, às vezes espinhos enclausurando mistérios. E depois das memórias embrulhadas nos dias todos, gravadas neles como riscos afundados no lado de dentro da pele, disse de novo que em cada estação renasce o outro tempo, o da mudança; e que a mudança apenas anuncia a conformação, não vá o informe perder-se por ausência de limites.
Limito-me a constatar os encantamentos, digo ainda: a claridade que em certos dias de Outono se solta em raios por detrás das nuvens, a encosta a verdejar nos olhos, o cheiro muito forte da terra…
Submeto-me ainda à ilusão das palavras mesmo sabendo que o que nelas passa a símbolo não é mais do que o fascínio e a construção dos olhos. Contudo afaguei o vento e, de mãos abertas, desconstruí a maior parte dos silêncios.
Foi preciso aguardar o momento certo para ver sair do casulo a simplicidade.

Tuesday, October 09, 2007

Imitação do Outono



Se é um tronco posso imitar-lhe a robustez
e copiar-lhe o castanho forte;

Se é uma raiz posso pedir-lhe a força
e ligar-me veementemente ao chão; somos irmãs.

Depois virá Zéfiro e levar-me-á nas folhas douradas,
abanando-me os ramos mansamente.

Com elas irei, asas sábias de aves migratórias,
ou tapete estaladiço sob os pés de meninos em corrida.




Monday, October 08, 2007

Eslovénia





É de facto um país pequeno e pouco populoso – um pouco mais de 2 milhões de habitantes, estando cerca de 1 milhão e meio na República da Eslovénia e os restantes dispersos como minorias nas regiões fronteiriças com a Itália (Friuli-Venetia Giulia e Trieste), com a Áustria (Carinthia), Hungria (Porojabe) e Croácia.
Resultado de um longo processo histórico cujas últimas mudanças ocorreram em 1991 – quando se tornou um Estado independente – e em 2004, quando se torna parte da União Europeia, a Eslovénia é uma surpresa para quem, como nós, se habituou a ter apenas uma fronteira a leste. Aqui o resto é mar e é no mar que está parte da nossa História. Lá, há toda uma riqueza de influências que são o resultado de movimentos sucessivos de povos e do cruzamento de ideias e culturas diferentes.
Foi tardio, ali, o despertar da consciência nacional. O peso do Império Áustro-Húngaro foi longo e só depois da Primeira Guerra Mundial surge um esboço de projecto político.O papel das minorias? Grande, porque foi das comunidades que viviam no exterior deste espaço que veio a força organizativa que visava impedir o extermínio da etnia eslovena pela Jugoslávia federal. Ocupação militar e depois tentativa de neutralização da língua foram as estratégias tentadas mas a resistência surtiu efeito e hoje não é só no solo pátrio que os eslovenos o são: são-no também nas regiões fronteiriças onde, apesar de minoritários, a língua, os costumes e o direito de se ser esloveno está consignado na lei.
E depois é surpreendente como uma cidade pequeníssima (Maribor) tem uma Universidade tão grande e tão organizada e tão cheia de departamentos de tudo e mais alguma coisa. Para não falar no teatro e na ópera e nessas coisas que não estamos habituados a ver funcionar entre nós.
Cansada da distância, mas mais rica depois de ter lá estado.
E sim, correu tudo muito bem!