Sunday, September 30, 2007

A Intolerância

Um dos casamentos de D. Manuel

Tudo começa quando o rei D. Manuel, para satisfazer os «escrúpulos religiosos» de D. Isabel – a noiva castelhana filha de Fernando e Isabel, os Reis Católicos – decide expulsar os judeus do território nacional.
Os cronistas relatam pormenorizadamente a questão da expulsão, descrevendo os pareceres – que o próprio monarca pediu – divididos entre os que eram favoráveis à permanência dos judeus em Portugal e os que defendiam a sua expulsão.
Diziam os primeiros que se o papa permitia a permanência deste povo nas suas terras, tal como o permitiam a Hungria, a Boémia, a Polónia e a Alemanha, por que não seguir-lhes o exemplo? A expulsão levá-los-ia directamente para o norte de África onde a esperança da conversão se perderia e, pior do que isso, onde eles iriam ensinar aos mouros os “truques” a usar contra os cristãos. De igual modo o rei perderia serviços e tributos e o reino perderia talentos.
Diziam os segundos que se a França, a Inglaterra, a Escócia, a Dinamarca, a Noruega e a Suécia os expulsaram e sendo Portugal vizinha de Castela e de França, corriam-se sérios riscos de se verem prejudicadas as relações com estes países. Por outro lado as vantagens, tendo em conta os tributos e os serviços que podiam prestar ao reino, eram menores que os riscos que se corriam.
Tomada a decisão, no início de Dezembro de 1496 o rei determina: “que os judeus se fossem do reino, com suas mulheres e filhos e bens, mas também os mouros pelo mesmo modo", para que lhes limitou o tempo e lhes nomeou os portos de embarque.

Friday, September 28, 2007

A tolerância

Lisboa no séc. XVI

Desde a criação do Reino de Portugal até à promulgação do Édito de Expulsão (1496) supõe-se que terá havido um clima de relativo convívio entre as populações cristãs e judaicas; a existência de judiarias (sempre que a comunidade era superior a dez elementos) nem sempre foi extra muros, embora com o passar dos tempos se tornasse comum essa localização.
Sabe-se que D. Afonso Henriques nomeia um judeu como seu almoxarife-mor.
Os primeiros reis protegem-nos e contam com eles (e com os mouros) para o povoamento do reino, por isso são-lhes dadas terras, assistindo-se a uma certa prosperidade social e económica em virtude desse clima de integração. Muitas vezes são utilizados como diplomatas ou espiões dos reis portugueses, entre os turcos e os mouros, pela facilidade com que se relacionavam com os poderosos no comércio.
D. Manuel chegou a recorrer a Abrãao Zacuto, conceituado astrónomo judeu expulso de Espanha, para saber da possibilidade de uma viagem até à Índia.
Chega a questionar-se este ambiente de tolerância religiosa sob a alegação de que a violência constitui um traço central da relação entre cristãos, judeus e muçulmanos, uma violência exercida de forma constante na vida quotidiana.
De facto há conhecimento de vários assaltos, particularmente o de 1449, ocorrido na judiaria grande, em Lisboa; porém, também há notícia de medidas exercidas sobre os cristãos que roubam. São episódios esporádicos e, ao que parece, não directamente relacionados com questões religiosas.
Até ao reinado de D. Manuel a convivência foi, pois, relativamente pacífica.
Sobre a comunidade mourisca sabe-se pouco. Seriam uma minoria de condição modesta a viver em mourarias, diminuindo em número durante toda a Idade Média, devido à conversão e assimilação progressiva de uma parte (mínima) e à emigração para a Espanha Islâmica e Maghreb. A maior parte destes mouriscos constituíam mão-de-obra escrava.
No Paço Real havia músicos mouriscos que cantavam e tangiam com alaúdes e pandeiros, charamelas, harpas, rabecas e tamboris – ao som dos quais dançavam os moços fidalgos durante o jantar e a ceia.
Além de bailarem, ocupavam-se de serviços do campo, tratavam dos animais e cozinhavam. Podiam dedicar-se ao comércio mas se o faziam era para vender produtos de raiz agrícola, vinho, azeite ou fruta seca. Quando escravizados podiam constituir sinal de riqueza para quem os possuía: podiam ser emprestados, oferecidos ou mesmo constar nas heranças dos seus donos.
As mulheres faziam o acompanhamento de senhoras em saídas festivas, trabalhavam na seca do peixe ou como lavadeiras: a limpeza da cidade era assegurada pelas mil "negras da canastra" enquanto outras mil carregavam água dos chafarizes para as casas: um vintém para o senhor e outro para a trabalhadora escrava ou forra. Mil e quinhentas lavadeiras e ensaboadeiras por conta de outrem – “mulheres e negras” – tratavam da roupa de seus donos.

Monday, September 24, 2007

Sem tempo para nada





Durante uns dias não consigo fazer mais nada.

Por agora circulo entre luzes e sombras... enquanto me preparo para ouvir falar sobre Discriminação e Tolerância, no âmbito da temática das Minorias.

Também vou falar mas não é sobre blogues, nem sequer sobre poesia. É acerca das minorias em Portugal no século XVI, particularmente Judeus e Mouros.


Depois de regressar dir-vos-ei como foi.

Saturday, September 22, 2007

luz/sombra



Era o céu a rasgar-se numa espécie de dia fora do tempo e eu concentrada na direcção circular que me trazia de volta a um lugar sem trevos mas, ainda assim, acolhida na frieza da fechadura que me reconhecia a mão.
No lado de dentro, a salvo do relampejar fino que me iluminara o caminho, o silêncio alimentava-se dos céus zangados e incomodava-me o nervo frágil.
Saí a refrescar o medo sem ter descortinado se me satisfazia ou me desagradava o excesso de ordem e a submissão aos elementos.
A chuva arrefeceu-me os braços despidos. Depois deitei a insónia nas trevas.
Pela madrugada estiquei os tendões adormecidos e tacteei o vazio com os olhos, antes que a luz nascesse.

Sunday, September 16, 2007

a linguagem das pedras em tempo de memórias

Roma

estavas inscrito nas pedras, à superfície
de um tempo que passou e se passou
marca cravada nos capitéis do pensamento
mesmo ao longe, noutra latitude,
nos ângulos de outros frisos
nos restos de outras realidades.

senti ainda a tua ausência no que restou
do labirinto das crenças
nos fragmentos subterrâneos,
na triangulação quebrada das fachadas
nas praças povoadas de mitos
e nas águas que os deuses faziam jorrar para dentro das fontes.



Saturday, September 15, 2007

Os livros


A maria_arvore sugeriu-me a selecção dos 10 livros que ajudaram a estruturar esta que hoje sou.

Antes de os enumerar tenho de dizer uma coisa que não é exclusiva do meu sentir: os livros marcam-nos consoante a idade que tínhamos quando os lemos, havendo alguns relativamente aos quais nos perguntamos, uns anos depois, "como foi possível que eu tivesse lido aquilo"? Por outro lado, deve ser difícil a cada um de nós eleger apenas dez...

Aqui vão aqueles de que mais me lembro...

1. A Náusea, de J. P. Sartre, lida por volta dos 14-15 anos, quando me perseguiam as primeiras crises existenciais, ainda antes de certos pensamentos terem nome;
2. A um Deus desconhecido, de J. Steinbeck, pela mesma altura, quando procurava desesperadamente entender a crença e incorporá-la;
3. O Doutor Jivago, de B. Pasternak, há muitos anos, porque já me interessava pela História mas sobretudo pela surpreendente entrada no labirinto dos sentimentos;
4. Esteiros, de Soeiro Pereira Gomes, numa altura em que ainda não sabia que o neo realismo era literatura datada; apenas lhe sentia o gosto, acompanhado pelo sentimento de revolta;
5. As Brumas de Avalon, de M. Zimmer Bradley, a alimentar-me as fantasias...
6. O Nome da Rosa, de Umberto Eco, em leitura compulsiva, num fim de semana em que até me esqueci dos filhos...
7. A Obra ao Negro, de M. Yourcenar, como testemunho exímio de uma época, escrito com o coração e com o saber de uma das melhores escritoras de todos os tempos;
8. Era bom que trocássemos algumas ideias sobre o assunto, de Mário de Carvalho, numa feliz descoberta de uma poderosa arte irónica;
9. A Costa dos Murmúrios, de Lídia Jorge, construção ficcional perfeita, o romance dentro do romance e a vida vista por dentro e por fora, com a inversão de todas as regras como caminho necessário à escrita de uma obra-prima; e depois também O Cais das Merendas, O dia dos Prodígios, O Vale da Paixão e mais recentemente Combateremos a Sombra. Escrita indispensável ao meu crescimento literário; mas também visão crua, farpa infalível cravada na realidade que não escapa aos olhos e ao coração.
10. A Casa e o cheiro dos Livros, de Maria do Rosário Pedreira, poesia para ler a toda a hora;
... e todos os livros daquela poesia que me enche a alma...


... e agora? Onde ponho os Eças, particularmente Os Maias e A correspodência de Fradique Mendes, numa analogia perfeita com os nossos dias. E o Fernando Pessoa? E os outros?


E agora passo o desafio a todos os que gostam de livros...


Wednesday, September 12, 2007

Cheiro a terra molhada


Esta tarde vieram as chuvas.

Sob os candeeiros da rua deslizaram riscos molhados
Trazendo uma frescura branda ao fim do dia

Nos jardins as corolas ficaram mais viçosas
E da terra soltou-se o cheiro mágico das palavras maduras

Não sei se viste que pus flores nas jarras
E sementes de pétalas no canteiro da estação que se avizinha.



Thursday, September 06, 2007

Regresso


Estou de regresso.
Voltei, devagarinho, como num fim de tarde se regressa da beira-mar e se toma um duche fresco.
Trago as marcas do sol no sal da pele e nos pés o ritmo bom das caminhadas.
Trago serenidade e palavras para escrever. Não são outras, são as mesmas; mas posso sempre trocar o lugar das sílabas e usar janelas novas. E luz, mesmo nos dias curtos que não tardam.